Reza!...
Agora fala com Deus, responde ao seu convite, aos seus apelos, inspirações, mensagens, ao chamamento que te dirigiu na Palavra, através do Espírito Santo. Não vês que foste acolhido no âmbito trinitário, no inefável diálogo entre Pai, Filho e Espírito Santo? Não te detenhas mais na reflexão e entra em diálogo e fala como um amigo fala ao seu amigo (Dt,10). Não procures conformar os teus pensamentos aos seus mas procura-O. A meditatio tinha como objectivo a oratio. Atingiste-a! Não faças mexericos espirituais, antes fala-Lhe com parresia, com confiança e sem medo, longe de qualquer olhar sobre ti próprio, mas arrebatado pelo vulto emerso no texto, em Cristo. Deixa livre as tuas capacidades criativas de sensibilidade, de emotividade, de evocação e coloca-as ao serviço do Senhor. Eu não posso dar-te muitas indicações, porque apenas cada um conhece as suas medidas e não as pode/deve ditar aos outros. O que se pode dizer do fogo quando se está nele? O que se pode dizer da oração-contemplação no final da lectio divina se não que ela é a sarça ardente que arde sem se extinguir e que inflama o coração do crente fazendo-O arder de amor pelo Senhor?
Arte inefável da experiência da divina presença, a lectio divina pretende conduzir-te aqui, onde tu como amado contemplas, repetes as palavras do amante na alegria, no espanto, no esquecimento de ti. Não penses que este caminho é sempre fácil, linear e sempre precorrível até ao fim. Temor e amor apaixonado, gratidão e aridez espiritual, entusiasmo e apatia física, palavra audível e palavra muda, silêncio teu e silêncio de Deus estão presentes e ntercalam-se na tua lectio divina, dia após dia.
Importante é ser fiel a este encontro: mais cedo ou mais tarde a Palavra ocupa lugar no nosso coração, superando os nossos obstáculos, aqueles que estão sempre presentes num caminho de fé e de oração. Apenas quem é assíduo à Palavra sabe que Deus é fiel e que não prescinde de se fazer encontrar e de falar ao coração, sabe que existem tempos em que é escassa a Palavra de Deus (1 Sam 3,1) aos quais sucede a Epifania da Palavra e sabe que estes tempos de dificuldade, de desconforto, de aridez espiritual são uma graça que recorda a distância que permanece do conhecimento absoluto de Deus.
Agradece a Deus pela palavra dada, por Aqueles que a anunciam e a explicam, intercede por todos os irmãos que o texto te tenha evocado nas suas virtudes e nas suas debelidades, tende a unir o alimento da Palavra ao alimento Eucarístico. Conserva tudo aquilo que viste, ouviste e saboreaste durante a lectio, conserva-o no coração e recorda-o, puxa pela memória e vai na companhia dos homens, entre eles e humildemente dá-lhes a paz e a bênção que recebeste. Terás a força para agir com eles, para realizares na história a Palavra de Deus, com todo a tua actividade social, política, profissional... Deus tem necessidade de ti como instrumento no mundo para fazer os novos céus e a terra nova. Um outro dia te espera, um dia em que tu, vendo Deus face-a-face na morte, mostrarás se foste letra viva de Cristo, lectio divina para todos os teus irmãos, o próprio Filho de Deus.
tuo Enzo
ENZO BIANCHI, Pregare la Parola. Introduzione alla «lectio divina»,
Piero Gribaudi Editore, Torino, 1990, pp. 101-103